Avaliação tomográfica para TAVI: reconstrução multiplanar (MPR) e Coaxialização
- Laio Wanderley
- há 4 dias
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Atualizado: há 3 dias

Na nossa primeira publicação (clique aqui para ler), introduzimos o assunto falando da importância da Tomografia pré-TAVI e o primeiro passo na sua avaliação; que consiste em Identificar corretamente o arquivo do paciente, verificar a espessura dos cortes e a sincronização com ECG, e notar a presença de artefatos.
Agora, vamos seguir o nosso roteiro, indo para o passo 2 e 3 - Relembre o nosso sumário:
Identificação e avaliação da qualidade da angioTC protocolo TAVI (clique aqui se quiser revisar)
Ajuste de janela para osso (ww/wl osso) e aplicação da Reconstrução Multiplanar (MPR)
Coaxialização – alinhamento dos eixos tomográficos com o anel aórtico, no mesmo plano
Análise qualitativa - valva aórtica,Via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE) e raiz
Análise quantitativa - dimensionamento do Anel aórtico e VSVE
Análise quantitativa- Altura e relação com as coronárias
Análise quantitativa- Seios de Valsalva e junção sinotubular
Ângulações e projeções ideais para o implante
Acessos femorais – avaliação panorâmica (3D)
Acessos femorais – análise detalhada por reconstrução multiplanar (MPR)
Passo 02: Aplicação da Reconstrução Multiplanar (MPR) e Ajuste de janela óssea (ww/wl osso)
a. Primeiro, aplique a ferrameta de reconstrução multiplanar (MPR).
O MPR em tomografia é um recurso de software que permite a visualização de uma única série de imagens em diferentes ângulos e planos (axial, coronal, sagital).

Essa técnica, que não gera perda de qualidade nas imagens, possibilita uma análise mais detalhada das estruturas, em diversos ângulos. É nele que iremos realizar as medidas tomográficas (diâmetros, área, altura das coronárias, etc.)




Dica de orientação dos cortes na tomografia: Notem que cada corte da tomografia está representado por uma cor. Os softwares de análise (como Horos ou OsiriX) costumam usar cores padronizadas para cada plano de corte, ajudando o operador a se orientar. Essa orientação é fundamental, principalmente quando começamos a alterar os eixos e cortes clássicos (como veremos no próximo passo). Abaixo, segue um bizu das linhas e planos:
🟣 Linha roxa → Plano Transversal
Seguindo a nossa analogia, no corte trasnversal é como se o escultor estivesse cortanto o bloco em lâminas horizontais, empilhadas uma sobre a outra, sendo possível ver cada uma separadamente (quando deslizamos a imagem para cima e para baixo).
Esse corte tomográfico é representado pela linha roxa (no programa Horos).
Observem na imagem acima que nos planos sagital e coronal (A e C) a linha roxa aparece para mostrar onde está passando o corte transversal.
Já na imagem próprio corte transversal (B), a linha roxa não aparece,e sim um cortono com um pequeno quadrado no canto superior, pois ele é a representação direta desse plano.
🔵 Linha azul → Plano Coronal
O plano Coronal mostra o bloco (corpo) em cortes e camadas frontais , como se olhássemos o paciente de frente.
As linhas azuis representam o local onde está sendo realizado o corte coronal. Como nos demais, quando a linha não aparece, significa que estamos vendo a representação direta do próprio plano de corte.
🟠 Linha laranja → Plano Sagital
Mostra: cortes laterais, dividindo corpo em direito e esquerdo.
Representa o corte “de lado”, em perfil
Nos outros planos, a linha laranja indica a posição do corte sagital; no próprio corte sagital, a linha não aparece, pois estamos vendo o plano diretamente.
Dica: ao analisar o anel, a raiz e a valva aórtica (ou qualquer outro órgão ou estrutura), procure sempre manter o padrão de cores e planos. Por exemplo: se estivermos estudando o anel aórtico virtual, mantenha o corte transversal representado pelo roxo, e assim sucessivamente para os demais planos. Por sua vez, se for analisar a artéria femoral, tente fazer o mesmo, cortando trasnversalmente o vaso com as linhas roxas.
Seguir esse padrão ajuda a manter a orientação correta para as mais diferentes estruturas e evita que o operador se perca durante a análise.
b. Após selecionar o MPR, aplique a janela óssea (bone).
A configuração de janela óssea em uma tomografia computadorizada melhora a visualização de tecidos densos, como o osso e o cálcio (presentes da valva e aorta), fazendo com que as calcificações pareçam brancas e detalhadas.
Essa janela faz com que os tecidos moles pareçam desbotados,e o contraste na aorta menos "denso" ou intenso. Devemos lembrar que a idéia é ver contraste entre os tecidos e o cálcio presente na região, e não somente a aorta contrastada
O uso de contraste tem a capacidade de dar destaque a vasos sanguíneos, mas pode obscurecer as calcificações, fazendo com que pareçam mais semelhantes em densidade.
Portanto, as janelas ósseas ajudam a diferenciar o que é contraste vs. cálcio vs. Tecidos, o que é ótimo para realização das medidas e delimitação do grau de calcificação.


Passo 3. Coaxialização
a. Definição:
O prefixo “co-” vem do latim e significa “junto, em comum, ao mesmo tempo”; enquanto que Axial é aquilo que está relacionado a esse eixo (linha imaginária que serve de referência para orientação).
Dessa forma, Coaxialização é o processo de alinhar os diferentes planos de corte da tomografia (corte transversal, sagital e coronal ) de modo que fiquem no mesmo eixo do anel aórtico virtual e estruturas da raiz.
b. Por qual motivo coaxilizar?
A coaxialização ajusta os cortes da tomografia para que fiquem orientados conforme o eixo anatômico de interesse (Anel valvar aórtico virtual, seio coronário, Junção sino-tubular, Aorta, etc.), garantindo medidas corretas e imagens não distorcidas.
Analogia didática:
Imagine que você tem três câmeras filmando um objeto (uma em cima, outra de frente e outra de lado).
Se cada câmera estiver um pouco torta, a imagem final fica distorcida, dando a ilusão de um objeto ter um dimensão falsa (sabe quando a foto é retirada de baixo para cima, e temos a perspectiva que o objetivo é maior do que de fato ele é).
Mas quando você ajusta todas as câmeras para apontarem exatamente para o centro do objeto, elas ficam coaxiais, permitindo fotografias (cortes tomográficos) numa perspectiva exata do objetivo, minimizando distorções
Na tomografia, isso garante que o operador está avaliando a válvula aórtica com a melhor orientação possível, sem inclinações que poderiam gerar erro de medida.
c. Como fazer a coaxialização:
Colocar o corte transversal (roxo no OsiriX) no plano do anel virtual (base dos três folhetos da valva aórtica)
Alinhar o corte sagital (amarelo) e o coronal (azul) no mesmo eixo da via de saída e raiz da aorta.
Depois faça o ajuste fino - o objetivo é fazer com que os três folhetos desapareçam ao mesmo tempo no corte trasnversal (veja o vídeo abaixo para dar mais luz a este passo):
No corte transversal, leve o eixo de corte até o folheto não coronariano.
Desça até o folheto sumir.
Faça o alinhamento dos outros eixos para encontrar a base do seio coronariano esquerdo e não-coronariano (veja o vídeo! só explicando com palavras, é complicado).
Conceito dessa etapa: devemos tentar “cortar” o anel vitrual, válvula aórtica e raiz da aorta, perfeitamente transversal (como se estivesse cortando uma cenoura perpendicular ao seu eixo longitudinal).
Se não coaxializarmos corretamente, o corte fica oblíquo (imagine cortar a cenoura com a faca ou a cenoura inclinada)- o anel parece mais oval e com as medidas inadequadas. Isso é um risco de erro nas medidas do anel aórtico, e consequentemente, no sizing da prótese.

Por fim, para finalizar, vamos aproveitar o passo da coaxilização para revisar brevemente a anatomia tomográfica da raiz e valva aórtica. Nos outros passos, iremos aprofundando e observando outros detalhes da anatomia tomográfica, que difere um pouco da perspectiva da anatomia cirúrgica:

Pontes anatômicos:
Seio direito (RS) com cúspide direita (RC) voltada para frente → origem da artéria coronária direita (RCA).
Seio esquerdo (LS) com cúspide esquerda (LC) voltada para a esquerda → origem da artéria coronária esquerda (LCA).
Seio não coronariano (NS) e cúspide não coronariana (NC) voltados para o septo interatrial (AS).
Setas (a,b) → mostram as comissuras entre as cúspides.
(e) → mostra o anel aórtico (ponto basal de inserção das cúspides) e a junção sinotubular (STJ).
Outras estruturas visíveis:
Via de saída do ventrículo direito (RVOT), ventrículo direito (RV), átrio direito (RA), átrio esquerdo (LA), ventrículo esquerdo (LV), aorta ascendente (AA) e artéria pulmonar principal (MPA).
Em resumo:
Aplique a reconstrução multiplanar (MPR) e a janela de osso para analisar a fase arterial sincronizada da Angiotc
Realize a coaxialização na região do anel valvar aórtico virtual (veremos mais detalhes na próxima postagem)
Entenda a anatomia tomográfica da raiz da aorta (também iremos aprofundar no decorrer da análise)
Após esses passos, vamos seguir o nosso roteiro no próximo artigo.
Referências: 1.Blanke P, Weir-McCall JR, Achenbach S, et al. Computed Tomography Imaging in the Context of Transcatheter Aortic Valve Implantation (TAVI)/Transcatheter Aortic Valve Replacement (TAVR): An Expert Consensus Document of the Society of Cardiovascular Computed Tomography. JACC Cardiovasc Imaging. 2019;12(1):1-24. doi:10.1016/j.jcmg.2018.12.003
2.Nishida K, Yokoi Y, Yamada A, Takaya N, Yamagiwa K, Kawada S, Mori K, Manabe S, Kanda E, Fujioka T, Kishino M, Tateishi U (2020) Optimal phase analysis of electrocardiogram-gated computed tomography angiography in patients with Stanford type A acute aortic dissection. Euro J Radiol Open 7:100289
3.Toggweiler S, Loretz L, Wolfrum M, Buhmann R, Fornaro J, Bossard M, Attinger-Toller A, Cuculi F, Roos J, Leipsic JA, Moccetti F. Relevance of Motion Artifacts in Planning Computed Tomography on Outcomes After Transcatheter Aortic Valve Implantation. Struct Heart. 2023 Aug 3;7(6):100214. doi: 10.1016/j.shj.2023.100214. PMID: 38046862; PMCID: PMC10692358.
4.Imaging diagnosis of aortic stenosis Mittal, T.K. et al. Clinical Radiology, Volume 76, Issue 1, 3 - 14
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