Procedimento Híbrido na cardiopatia congênita: materiais e técnica cirúrgica híbrida
- Laio Wanderley
- 5 de out.
- 7 min de leitura

Começo este artigo relembrando duas publicações anteriores nossas que abordam o procedimento híbrido, com foco especial na interrupção do arco aórtico. Nos links abaixo (é só clicar), você poderá revisitá-las e revisar grande parte do conteúdo relacionado.
Nesta nova postagem, vamos complementar o tema. Discutiremos a indicação na hipoplasia do coração esquerdo (vale salientar que o conceito é semelhante), e traremos aspectos práticos, como os materiais utilizados e a técnica cirúrgica empregada.
Visão Geral do Procedimento Híbrido na Síndrome de Hipoplasia do Coração Esquerdo (SHEC)
A Síndrome de Hipoplasia do Coração Esquerdo (SHEC) – em inglês Hypoplastic Left Heart Syndrome (HLHS) – é uma cardiopatia congênita crítica caracterizada por subdesenvolvimento acentuado das estruturas do coração esquerdo.
O manejo clássico envolve paliação cirúrgica em estágios (cirurgia de Norwood, Glenn, Fontan), porém essas abordagens apresentam alto risco em recém-nascidos de clinicamente complexos (baixo peso <3 kg, aorta <2 mm de diâmetro, por exemplo). Como alternativa, desenvolveu-se o procedimento híbrido, combinando técnicas cirúrgicas e de cateterismo, para realizar a primeira etapa de paliação sem circulação extracorpórea.
No Estágio 1 Híbrido, originalmente descrito em 1993, realiza-se a bandagem bilateral das artérias pulmonares seguida do implante de um stent no canal arterial, mantendo-o patente para garantir o fluxo sistêmico. Esse procedimento é feito ainda no período neonatal, evitando o uso de circulação extracorpórea.
Também é fundamental assegurar uma comunicação interatrial não restritiva, para que haja adequado fluxo do átrio esquerdo para o átrio direito. Após alguns meses, prossegue-se para o estágio seguinte, mas aqui focaremos apenas no procedimento híbrido inicial e, em especial, nos aspectos práticos do procedimento
OBJETIVOS DO PRIMEIRO ESTÁGIO HÍBRIDO:
Manter um fluxo sistêmico desobstruído através do canal arterial — obtido por meio do implante de stent no ducto arterioso (PDA).
Equilibrar os fluxos pulmonar e sistêmico — alcançado com a bandagem (cerclagem) das artérias pulmonares.
Garantir uma comunicação interatrial sem restrição de fluxo — caso o defeito do septo atrial (CIA) seja restritivo em pacientes com hipoplasia do ventrículo esquerdo, é necessário realizar sua ampliação (atrioseptostomia).
LOCAL DO PROCEDIMENTO
Sala cirúrgica híbrida
Sala cirúrgica convencional com arco em C de fluoroscopia.
DICAS DO PRÉ-OPERATÓRIO:
Avaliar o diâmetro e anatomia do canal arterial pelo ECO e AngioTC (se disponível) para presumir o calibre do stent. Somar esses dados com o diâmetro encontrado na fluoroscopia.
Avaliar também o arco aórtico. Devemos lembrar quando o arco é extremamente hipoplásico, o stent pode agravar a obstrução ao empurar o canal contra o arco distal - o que pode ser fatal no paciente que depende de fluxo retrógado.
MATERIAIS USADOS NO PROCEDIMENTO:
Prótese vascular de PTFE 3 ou 3.5 mm:

3 mm se peso abaixo de 3 Kg
3.5 mm se peso acima de 3 kg
Introdutor 5F ou 6F

Fio Guia:
Fio guia V-18 Control Hidrofílico - 0,014 ou 0,018 polegadas
Pode ser usado para cruzar o canal e navegar,

Abbott 1001311 HI-TORQUE IRON MAN Guide Wire 0.014" - outra opção para entrega e suporte do balão
Stents possíveis de serem usados.
Podem ser usados stens auto-expansível ou balão expansíveis. Usualmente, o segundo é mais usado.
Ao solicitar o material, estudo bem o modelo e diâmetros vs. comprimentos disponíveis
Canais pequenos, podemos usar stents de coronária (especialmente quando o diâmetro do canal for menor que 4.5 mm).
Os stents não são dedicados ao uso em canal arterial. Dessa forma, não devemos estranhar, se ao ler as instruções de uso, haver informações de uso periférico.
Solicite Diâmetros e comprimentos dos stents de 5 mm a 10 mm e de 8 mm a 15 mm, respectivamente.
O ideal é ter a grade completa disponível, mas não será incomum encontrar grades de stents com diâmetro máximo de 7 mm.
Com base no comprimento e no diâmetro do ducto, é escolhido um stent de 1 a 2 mm maior em diâmetro que a maior dimensão do ducto e suficientemente longo para cobrir todo o seu comprimento.
Modelos de Stents sugeridos na literatura:
Expresses Vascular SD, da Boston.


Palmaz Blue .014 Peripheral Stent System.
Palmaz Genesis
Cordis Medical 180
Herculink;

Express vascular LD;
Dynamic;
Orsiro.
Insuflador - olhar a tabela do ATM vs. Diâmetro nominal

Passos do Procedimento:
Dicas:
Realizar a bandagem dos ramos pulmonares antes do implante do stent. Após o implante, dissecar e bandar o ramo pulmonar esquerdo torna-se arriscado, com risco de perfuração e distorção anatômica.
Evitar a introdução de cateteres no coração esquerdo hipoplásico. Distorções provocadas pelos guias na valva tricúspide ou pulmonar podem causar instabilidade hemodinâmica e lesões valvares.
Etapa cirúrgica:
Esternotomia mediana
Confeccionar bandas para o ramos pulmonares
O comprimento das bandas e consequente raio e diâmetro são calculados conforme o peso do paciente.
Usar Prótese vascular de PTFE 3 ou 3.5 mm
3 mm se peso abaixo de 3 Kg
3.5 mm se peso acima de 3 kg

Esternotomia mediana;
Pericardiotomia alta em T invertido, o suficiente para expor os vasos da base e o canal arterial;
Realizar a bandagem dos ramos pulmonares direito e esquerdo;
Ramo direito
Exposição relativamente simples, entre a aorta ascendente e a veia cava superior, proximal à origem da artéria pulmonar superior direita.

Ramo Esquerdo:

Exposição mais difícil.
Dar Pontos de reparo e tracionar a artéria pulmonar para a direita (ajuda na exposição).
Um pequeno coxim de gaze pode ajudar a deslocar a aurícula esquerda, que normalmente repousa sobre o ramo pulmonar esquerdo.
Etapa Endovascular:
Dupla bolsa com fio Prolene 6.0 no tronco da artéria pulmonar.
Cateterização do tronco da pulmonar com introdutor 6-7 Fr.
Introduzir o mínimo possível de introdutor na artéria pulmonar. Isso facilitará a cateterização e implante do stent no canal.


A fluoroscopia é posicionada em uma incidência lateral ou oblíqua lateral (perfil) de forma a alongar totalmente o ducto, evitando sobreposições. Essa projeção lateral evidencia o trajeto completo do canal arterial desde sua origem na bifurcação pulmonar até sua inserção na aorta descendente, permitindo medidas precisas do comprimento e diâmetro interno mínimo do ducto.

Injeção de contraste (diluir o contraste 50% ou 33%) no tronco pulmonar por meio do introdutor para estudo da anatomia do defeito.
Projeção angiográfica: Indicência em perfil.
Após a injeção, realizar as medidas de comprimento e diâmetro do canal.

Passagem de guia através do canal arterial
Exemplos de guias
Fio guia V-18 Control Hidrofílico - 0,014 ou 0,018
Abbott 1001311 HI-TORQUE IRON MAN Guide Wire 0.014"
Seleção do stent baseado nas medidas do canal arterial - O comprimento e diâmetro do stent irá variar conforme a anatomia do canal arterial.
Exemplos de stents usados
Palmaz Blue .014 Peripheral Stent System, Cordis Medical 180 - diâmetros e comprimentos dos stents - de 5 mm a 10 mm e de 8 mm a 15 mm, respectivamente.
Outro modelo
Stent Express Vascular SD Monorail 5F - Premonted - possui diâmetro máximo de 7 mm. Então cuidado se o canal for muito grande.
Diâmetro do stent: Deve superar ligeiramente o diâmetro interno máximo do ducto para assegurar patência completa. Em neonatos, costumam-se usar stents de 3,5 a 4,5 mm de diâmetro, escolhendo valores maiores para ductos mais calibrosos ou conforme o peso do paciente (maior peso, maior diâmetro suportado). Oversizing excessivo deve ser evitado para não causar dissecção ou rompimento do ducto.
Comprimento do stent: Idealmente o stent deve cobrir toda a extensão do canal arterial, desde a origem na bifurcação pulmonar (logo após a artéria pulmonar esquerda) até a junção com o arco aórtico.
Recomenda-se que o stent se estenda ~1–2 mm além da extremidades do ducto, sem progredir significativamente para dentro da
Isso assegura que não haja segmentos do ducto sem stent (que poderiam se fechar) e evita que a malha metálica obstrua o lúmen aórtico ou dificulte futuras.
Como boa parte dos stents premontados modernos praticamente não encurtam ao expandir (foreshortening <1%), o comprimento selecionado pode corresponder diretamente ao comprimento medido do (por exemplo, ducto de 15 mm, stent de 15 mm).
Em casos de ducto muito longo ou tortuoso, pode ser necessário implantar dois stents.
Implante de Stent no canal arterial guiado por Fluoroscopia
Sob fluoroscopia , o stent é manipulado até a posição desejada.
Pequenas injeções de contraste pelo introdutor auxiliarão a verificar que as extremidades do stent cobrem adequadamente o ducto, sem invadir o ramo da artéria pulmonar esquerda proximal ou protruir no arco.
Com o stent posicionado, insufla-se gradualmente o balão do stent até atingir a pressão nominal para o calibre do stent.
Uma técnica útil é inflar inicialmente de forma parcial, criando um formato de “osso de cão” (balão expandido nas pontas e estreito no meio) que ancora as extremidades sem expandir. Isso permite últimos ajustes finos na posição antes da expansão completa.
Realiza-se uma angiografia de controle, normalmente na mesma projeção lateral, para avaliar o resultado.
Verifica-se também se não houve comprometimento dos ramos das artérias pulmonares (especialmente a esquerda) na região próxima ao stent, e se o arco aórtico está pérvio sem obstrução pelo stent.
Caso seja identificado algum segmento do ducto não coberto (por exemplo, se o stent inicial foi muito curto), pode-se implantar um segundo stent sobreposto na mesma sessão para garantir cobertura.
Pequenas pós-dilatações com balões de maior diâmetro também podem ser feitas se o stent não expandiu totalmente ou se há discrepância de calibres.
Uma vez satisfeitos com o resultado angiográfico, remove-se cuidadosamente o conjunto cateter/guia sob fluoroscopia.
Após remoção do introdutor da artéria pulmonar, proceder a hemostasia e fechamento da ferida operatória.
Referências: 1. Fate of the Ductal Stent After Hybrid Palliation for Hypoplastic Left Heart SyndromeBaba, Kenji et al.The Annals of Thoracic Surgery, Volume 95, Issue 5, 1660 - 1664
SIEVERT, Horst; QURESHI, Shakeel A.; WILSON, Neil; HIJAZI, Ziyad M. (Eds.). Percutaneous Interventions for Congenital Heart Disease. Boca Raton: CRC Press, 2007.
The Hybrid Approach to Hypoplastic Left Heart SyndromeGalantowicz, MarkOperative Techniques in Thoracic and Cardiovascular Surgery, Volume 14, Issue 2, 74 - 85
Fonte das imagens
Akay E, Işık O, Engin AY, Çakır V. Stage 1 hybrid palliation of hypoplastic left heart syndrome: an initial experience in pulmonary trunk approach, procedural modifications, and complication management. Turk J Med Sci. 2019 Oct 24;49(5):1374-1380. doi: 10.3906/sag-1903-143. PMID: 31549495; PMCID: PMC7018386.










































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