Avaliação tomográfica para TAVI: introdução e os passos principais.
- Laio Wanderley
- 14 de set.
- 6 min de leitura
Atualizado: 15 de set.

"Cirurgia se planeja de véspera" — como costuma dizer o chefe, professor José Wanderley
No contexto do implante transcateter da válvula aórtica (TAVI), esse “operar de véspera” significa realizar e estudar um exame fundamental: a tomografia computadorizada (Angio-TC) com protocolo TAVI.
Não há mais dúvida de que o tratamento transcateter da estenose aórtica veio para ficar na rotina do Cirurgião. Seu crescimento é exponencial, tanto nas indicações — já alcançando pacientes de baixo risco cirúrgico — quanto no número de procedimentos.
Os registros demonstram uma ascensão contínua ao longo da última década e, hoje, já observamos que, tanto no SUS quanto na saúde suplementar, esse procedimento é uma realidade bem estabelecida. Dessa forma, é fundamental para o cirurgião cardiovascular saber analisar a Angio-TC protocolo TAVI de maneira a indicar o procedimento e eleborar a sua estratégia cirúrgica.


É a tomografia que nos fornece praticamente todo o planejamento do procedimento e antecipa muitos riscos. A partir dela, avaliamos:
Dimensionamento (Sizing) do anel valvar e raiz da aorta, escolhendo a prótese mais adequada e reduzindo riscos de mismatch, oversizing excessivo (prótese muito grande) e embolização.
Risco de complicações: rotura do anel, oclusão coronariana.
Projeções e ângulos ideais para o implante seguro.
Acessos vasculares, sobretudo o femoral, analisando calibre, tortuosidades e calcificações.
Ou seja, a tomografia revela nuances cruciais que guiam toda a estratégia cirúrgica. A partir daqui, vamos iniciar uma série de postagens sobre as principais etapas da avaliação pré-operatória para TAVI, sempre relacionando com reflexões práticas.
Abaixo , apresentamos um sumário dos 10 passos que iremos utilizar para avaliar a tomografia no protocolo TAVI. Cada um desses passos serão explorados nas postagens, para que você, meu amigo cirurgião cardiovascular, perca o receio de analisar o exame por conta própria (assim como eu perdi) e possa montar sua estratégia de forma confiante.
Identificação e avaliação da qualidade da angioTC protocolo TAVI
Ajuste de janela para osso (ww/wl osso) e aplicação da Reconstrução Multiplanar (MPR)
Coaxialização – alinhamento dos eixos tomográficos com o anel aórtico, no mesmo plano
Análise qualitativa - valva aórtica,Via de saída do ventrículo esquerdo (VSVE) e raiz
Análise quantitativa - dimensionamento do Anel aórtico e VSVE
Análise quantitativa- Altura e relação com as coronárias
Análise quantitativa- Seios de Valsalva e junção sinotubular
Ângulações e projeções ideais para o implante
Acessos femorais – avaliação panorâmica (3D)
Acessos femorais – análise detalhada por reconstrução multiplanar (MPR)
Então, vamos começar pelo começo, iniciando com o passo 01:
Como identificar e avaliar a qualidade do exame?
a) Selecione o arquivo DICOM do paciente correto e Abra no software:
Pode parecer detalhe tolo, mas enganos acontecem. Analisar a tomografia de outro paciente ou enviar o DICOM (como chamamos os arquivos digitais de imagens médicas) errado para a empresa que fará o relatório de planejamento (Report) é um erro simples, mas catastrófico — no mínimo, causa uma grande dor de cabeça.
Portanto, sempre confira o arquivo DICOM antes de enviar e, ao abrir no software (Horos ou OsiriX no Macbook, ou Radiant no Windows), verifique se o nome do paciente está correto.
Os três programas de visualização que que podem ser usados são: Horos, OsiriX e RadiAnt (clique na imagem para acessar o link do site).
Os dois primeiros acima (Horos e OsiriX) estão disponíveis para a plataforma da Apple. São bastante similares em termos de layout e ferramentas, sendo os mais completos, disponíveis e usados na prática.
O último, o RadiAnt, está disponível para Windows. Apesar de não contar com alguns recursos avançados (e a formiga que não passa cofiança nenhuma), é totalmente adequado para a avaliação inicial, oferecendo ferramentas para análise de diâmetro, perímetro, área, MPR, reconstruções 3D, entre outras. Portanto, se você não possui um MacBook, não há desculpa para não tentar avaliar a angioTC com protocolo TAVI.
b) Verifique a espessura dos cortes da tomografia e sua extensão (as imagens incluem toda a aorta, até as femorais).
Para analisar a raiz da aorta — uma região cheia de detalhes anatômicos — os cortes devem ser finos, idealmente abaixo de 1 mm. Isso garante melhor qualidade de imagem e uma visualização mais precisa das estruturas.
Para os vasos periféricos (femorais, especialmente), cortes ≤1.5mm são recomendados (não é necessário o refinamento de 1 mm que usamos para a raiz da aorta). Ao abrir o arquivo DICOM no programa, usualmente terá um fase com mais cortes, contemplando toda a aorta. é nessa fase que iremos avaliar os vasos periféricos.
Neste vídeo, mostramos, na prática, como verificar a espessura dos cortes. Neste caso, foi utilizado o programa Horos, que pode ser baixado no MacBook. Se estiver usando outro software, basta procurar essa informação, que geralmente estará em algum canto da tela.
c) Avalie a sincronização da tomografia com o eletrocardiograma:
A análise adequada do complexo valvar aórtico e da raiz da aorta depende de uma boa sincronização da tomografia com o ECG - minimiza artefatos de movimento e adquire imagens na sístole (que é fundamental, como veremos!).
A tomografia é gatilhada pelo ECG: o intervalo entre duas ondas R do QRS é dividido em fases (R-R).
Sístole: 0–40% do intervalo R-R
Diástole: 50–90% do intervalo R-R
Durante a sístole:
A área e o perímetro tendem a ser maiores do que na diástole.
Há redução da elipticidade do anel - ou seja, é o momento que ele está "mais redondo". ,
O contorno sofre estiramento,
O maior diâmetro do anel ocorre geralmente na sístole (20–40% do R-R). Por isso, os algoritmos e protocolos de sizing (dimensionamento) das próteses transcateter são, em regra, baseados nessa fase, que estará descrito no arquivo DICOM.
Mensagem prática: na TC, devemos sempre identificar a fase de maior diâmetro do anel, pois é nela que o sizing deve ser realizado. Geralmente, essa fase está entre 20–40% do intervalo R-R, já identificada no exame ao abri-lo. Escolher a fase errada pode levar a um undersizing não intencional — ou seja, medir o anel aórtico menor do que ele realmente é. Isso pode resultar na seleção de uma prótese inadequadamente pequena, aumentando o risco de embolização da prótese.
Obs 1: Em pacientes com hipertrofia ventricular acentuada, o maior diâmetro pode ocorrer na diástole (1).
Obs 2: Os demais segmentos (aorta descendente, ilíacas e femorais) não necessitam de sincronização com ECG ou cortes <1 mm.
d) Confirme se o contraste está na fase arterial e identifique artefatos
A fase arterial (ou seja, quando o constraste atinge a circulação sistêmica e a TC realiza a imagem) bem marcada é fundamental para avaliar corretamente o anel, os seios de Valsalva, a junção sinotubular e a relação com as coronárias. Erros podem acontecer, com problemática na injeção, sincronização ou volume de constraste, comprometendo a qualidade do exame.
Portanto, mesmo que haja no arquivo DICOM informações sobre a espessura e sincronização, seja crítico e fique atento também a fase arterial adequada e artefatos (de movimento, por exemplo) que possam comprometer a análise.
Quanto a anatomia tomográfica, fique tranquilo. Nas próximas publicações vamos aprofundando e revisando isso.

Em resumo:
A TAVI já é uma realidade na rotina do Cirurgião. Dessa forma, saber indicar e planejar o procedimento é fundamental.
Para avaliar inicialmente a angioTC com protocolo TAVI, faça:
Identifique corretamente o paciente.
Verifique as fases da tomografia, espessura dos cortes e a sincronização.
Certifique-se a qualidade do contraste e se não há artefatos de movimento
Nas próximas publicações, vamos seguir o nosso roteiro, comentando os próximos passos.
Referências: 1.Blanke P, Weir-McCall JR, Achenbach S, et al. Computed Tomography Imaging in the Context of Transcatheter Aortic Valve Implantation (TAVI)/Transcatheter Aortic Valve Replacement (TAVR): An Expert Consensus Document of the Society of Cardiovascular Computed Tomography. JACC Cardiovasc Imaging. 2019;12(1):1-24. doi:10.1016/j.jcmg.2018.12.003
2.Nishida K, Yokoi Y, Yamada A, Takaya N, Yamagiwa K, Kawada S, Mori K, Manabe S, Kanda E, Fujioka T, Kishino M, Tateishi U (2020) Optimal phase analysis of electrocardiogram-gated computed tomography angiography in patients with Stanford type A acute aortic dissection. Euro J Radiol Open 7:100289
3.Toggweiler S, Loretz L, Wolfrum M, Buhmann R, Fornaro J, Bossard M, Attinger-Toller A, Cuculi F, Roos J, Leipsic JA, Moccetti F. Relevance of Motion Artifacts in Planning Computed Tomography on Outcomes After Transcatheter Aortic Valve Implantation. Struct Heart. 2023 Aug 3;7(6):100214. doi: 10.1016/j.shj.2023.100214. PMID: 38046862; PMCID: PMC10692358.













































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