Degeneração da bioprótese valvar: entenda as causas e os mecanismos.
Atualizado: 8 de nov.
Fonte: Referência 01.
A Degeneração da bioprótese Valva é um assunto que desde o primeiro ano de residência ouvimos e falamos muito. Todas as vezes que vamos discutir e explicar a cirurgia de troca valvar para o paciente, explanamos o mesmo roteiro: “Olha Sr. Fulano de Tal, quando implantamos a prótese valvar biológica, ela não irá durar pelo resto da tua vida, o senhor terá que trocá-la depois de uns 10 anos, pois com o tempo ela vai envelhecendo e deteriorando”. É Engraçado perceber ser raro, ao menos na minha experiência, o paciente questionar os motivos pelos quais a prótese valvar se degenera... ou se ela vai durar aquele tempo todo como usualmente falamos.
O que é a degeneração da bioprótese valvar?
Basicamente, a degeneração da bioprótese valvar pode ser definida, superficialmente, como a perda ou alteração das qualidades da prótese, comprometendo a sua função hemodinâmica. Observe, caro leitor, que a palavra “superficialmente" deixa implícito que não pretendo discutir neste texto as inúmeras definições (clínicas e ecocardiográficas) existentes de degeneração da bioprótese, e muito menos as tentativas (europeia e americana) de padronização. Parece-me mais sensato e objetivo, por ora, se agarrar no conceito da palavra degeneração e segui-lo. Dessa forma, quando a prótese encontra-se decaída, muda para um estado pior ou perde suas qualidades estruturais e/ou hemodinâmicas, podemos dizer que ela se encontra degenerada, resultando no desenvolvimento de estenose, insuficiência ou ambas as lesões simultaneamente.
E quais são os mecanismos que provocam a degeneração?
Os mecanismos principais são:
1) Degeneração na estrutura da prótese;
2) Degeneração não-estrutural.
Com relação à degeneração estrutural, o processo de deterioração está intrinsecamente relacionado componentes estruturais da bioprótese (folhetos ou estruturas de suporte), resultando em espessamento, calcificação, rasgo ou ruptura dos materiais da válvula protética (1,3). Trata-se de uma condição primária, surge espontaneamente, sem ter associação com, ou ser causada por outra doença. Os mecanismos são desconhecidos, mas provavelmente incluem ruptura ou espessamento do tecido ao longo do tempo por causa do estresse mecânico em conjunto com tensões de cisalhamento de fluxo, promovendo ruptura de colágeno e calcificação tecidual(3).
Definição americana de degeneração estrutural bioprotética (3). A sua construção em estágios reflete o processo crônico, gradual e progressivo da deterioração valvar, ocorrendo no decorrer dos anos.
No que concerne à degeneração não-estrutural, ela surge a partir de problemas que possuem relação indireta com os componentes da prótese, provocando interferência na função deles. Trata-se, portanto, de um processo secundário à outra condição patológica. Trombose dos folhetos, crescimento de pannus, endocardite, leak-paravalvar e mismatch são exemplos de condições relacionadas à degeneração não-estrutural.
Mas como pannus, trombo ou vegetação podem provocar estenose ou insuficiência da prótese valvar?
O raciocínio é simples: basta só imaginar que qualquer objeto aderido ao folheto da prótese pode impedir seus movimentos de abertura e fechamento, análogo ao que acontece quando colocamos uma pedra na base da janela, de modo que ela não irá abrir ou fechar tão facilmente. No caso da endocardite, além do impedimento mecânico sobre os folhetos da prótese, o processo fisiopatológico pode ainda causar deiscência do anel valvar, ruptura e perfuração das cúspides (comprometimento estrutural de fato).
Imagem de uma bioprótese com degeneração não-estrutural, causada por trombos aderidos aos folhetos não-coronariano e coronariano esquerdo. Devido a presença dos trombos, os folhetos não se abriam adequadamente, gerando estenose valvar importante. A paciente teve que ser reoperada após 05 anos da primeira cirurgia, perante o insucesso da anticoagulação em reverter a disfunção valvar.
Fonte: própria.
Por fim, leitor, deixo para ti um resumo com o âmago do texto.
A definição de degeneração de bioprótese valvar são muitas (com recentes tentativas de padronização), mas o seu conceito e raciocínio devem estar atrelados à deterioração da função da prótese, usualmente flagrados na análise clínica (recorrência dos sintomas de insuficiência cardíaca, surgimento ou aumento da intensidade do sopro, etc.) e através de exames complementares (Ecocardiograma, Tomografia com contraste, etc.).
Há dois mecanismos principais de degeneração: estrutural e não-estrutural.
A degeneração, independente do mecanismo ou etiologia, irá provocar estenose, insuficiência ou às duas lesões simultaneamente.
Referências:
Bagur R, Pibarot P, Otto CM. Importance of the valve durability-life expectancy ratio in selection of a prosthetic aortic valve. Heart. 2017 Nov;103(22):1756-1759. doi: 10.1136/heartjnl-2017-312348. Epub 2017 Sep 13. PMID: 28903992.
European Heart Journal, Volume 38, Issue 45, 01 December 2017, Pages 3382–3390, https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehx303
Danny Dvir, Thierry Bourguignon, Catherine M. Standardized Definition of Structural Valve Degeneration for Surgical and Transcatheter Bioprosthetic Aortic Valves Jan 2018 https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.117.030729Circulation. 2018;137:388–399
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